O
balanço da 3ª feira em que dois dos mais emblemáticos personagens do
aparelho repressivo da ditadura militar tentaram embaralhar os fatos
relativos ao seu infame papel histórico foi o seguinte: àquele que
começou como agente provocador e acabou como anjo exterminador se negou
um lugar entre as vítimas, pois lobos em pele de cordeiro não enganam
ninguém; e aquele que não ouvia o grito dos torturados também não ouviu a
retirada da sentença que o igualou aos comandantes de Auschwitz e Buchenwald.
O ARQUIVO ANSELMO TAMBÉM SERÁ QUEIMADO?
Como
se previa, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça indeferiu a
pretensão do ex-marinheiro de primeira classe José Anselmo dos Santos,
conhecido como Cabo Anselmo, de ser reintegrado à Marinha como suboficial, além de receber uma indenização de R$ 100 mil em parcela única.
O
relator do processo foi o ex-ministro de Direitos Humanos Nilmário
Miranda, tendo seu voto sido acompanhado pelos outros 11 conselheiros.
Ele fundamentou a recusa em dois motivos:
- a grande possibilidade (vide aqui e aqui) de Anselmo ter começado a prestar serviços à direita golpista militar antes mesmo da quartelada de 1964, como agente provocador incumbido de radicalizar os protestos de marinheiros; e
- sua atuação posterior no esquema repressivo do terrorismo de estado, "participando de torturas, execuções e desaparecimentos" e até se vangloriando em entrevistas do infame papel que tinha desempenhado.
Houve
quem levantasse, na imprensa e na internet, a hipótese de Anselmo estar
atuando mais uma vez como provocador, no sentido de desmoralizar a
anistia federal. Seguindo tal linha de raciocínio, qual seria agora sua
utilidade, depois de prestado o serviço derradeiro, em vida, aos
famigerados remanescentes da ditadura?
Ele deveria se preocupar em não seguir os passos do seu parceiro de crimes, o delegado Sérgio Fleury. Pode estar chegando o momento da queima de arquivo. Talvez até de uma morte adequadamente maquilada para parecer vingança da esquerda, pois do boi só se perde o berro...
Ele deveria se preocupar em não seguir os passos do seu parceiro de crimes, o delegado Sérgio Fleury. Pode estar chegando o momento da queima de arquivo. Talvez até de uma morte adequadamente maquilada para parecer vingança da esquerda, pois do boi só se perde o berro...
USTRA NÃO APAGOU O REGISTRO EM CARTEIRA
O julgamento do recurso do (ausente) torturador Carlos Alberto Brilhante
Ustra contra a sentença da 23ª Vara Civel de São Paulo que o declarou torturador foi suspenso pelo Tribunal de Justiça a pedido do relator Rui Cascaldi,
que disse precisar de tempo para refletir melhor sobre o caso. Em
seguida, um dos juízes acrescentou que pretende estudar meticulosamente
os sete volumes do processo, antecipando aos interessados que eles não
devem alimentar a expectativa de uma retomada do julgamento em curto
prazo.
Então,
a sessão desta 3ª feira (22) se restringiu à sustentação oral do
advogado da Família Teles, o veterano jurista Fábio Konder Comparato
--que, tal como Dalmo de Abreu Dallari, é uma lenda viva do Direito
brasileiro.
Comparato
alertou que está em jogo "a dignidade do Estado brasileiro diante da
opinião pública nacional e internacional", daí o imperativo de a Corte
dar uma resposta incisiva aos "atos bestiais de tortura" pelos quais o
antigo comandante do DOI-Codi/SP foi responsável.
Ele
criticou o "chorrilho de questões preliminares" levantadas pela defesa,
que não apresentou nenhuma testemunha e restringiu suas alegações de
inocência às declarações do próprio Brilhante Ustra. Este nem sequer
negou a ocorrência das torturas e óbitos, apenas alegando, da forma mais
inverossímil possível, não haver tomado conhecimento dos maus tratos
infligidos a milhares e da morte de mais de 40 cidadãos na unidade sob
sua responsabilidade.
Como
é do conhecimento público, Brilhante Ustra comandou o DOI-Codi entre
setembro/1970 e janeiro/1974, tendo sido apresentadas 502 denúncias de
torturas referentes a tal período, durante o qual estiveram no inferno
da rua Tutóia cerca de 2 mil cidadãos presos por suspeita de subversão ou terrorismo.
E, no total dos seus seis anos de operações, o DOI-Codi paulista
prendeu (pelo menos) 2.372 opositores do regime militar e assassinou (no
mínimo) 50 deles, inclusive o jornalista Vladimir Herzog.
São três as questões preliminares com as quais Brilhante Ustra tenta safar-se sem ser realmente inocentado:
- Considera-se resguardado pela anistia de 1979, mas FKC esclareceu que tal lei não elimina a responsabilidade civil, "pois se trata do direito de particulares", que o Estado não pode anular com uma penada;
- A inadequação de ação declaratória como intrumento jurídico num caso desses, ao que FKC contrapôs que, desde as leis do Império romano, quem causa dano o deve reparar. "Houve ou não houve tortura? Se houve, o direito subsiste." Quanto ao fato da Família Teles não querer tomar "o dinheiro do algoz", isto não invalida a ação declaratória para fins de reparação moral, explicou o jurista; e
- A prescrição que, diz FKC, inexiste quando se trata de um "direito subjetivo".
Finalizando, Comparato
comentou que, quando o Conselho de Direitos Humanos da ONU está prestes a
se reunir em Genebra para discutir, entre outros assuntos, a impunidade
dos torturadores brasileiros, enquanto a Comissão da Verdade acaba de
ser instalada, seria patético o Tribunal de Justiça de São Paulo não
sentenciar como deve "o mais notório torturador do regime militar".
"CASA DE HORRORES" - A ação declaratória contra o torturador Brilhante Ustra foi movida pelo casal Maria Amélia e César Teles; pelos filhos Janaína e Édson; e por Criméia, irmã de Maria Amélia.
"CASA DE HORRORES" - A ação declaratória contra o torturador Brilhante Ustra foi movida pelo casal Maria Amélia e César Teles; pelos filhos Janaína e Édson; e por Criméia, irmã de Maria Amélia.
Fábio Konder Comparato: uma lenda viva |
César, Maria Amélia e Criméia foram presos em
1972. Janaína e Édson, então com 5 e 4 anos, chegaram a ser levados de
camburão ao DOI-Codi, como uma forma de tortura psicológica contra os
pais e tia.
Eis como Édson lembra o ocorrido:
Eis como Édson lembra o ocorrido:
"Nas dependências deste então órgão público/estatal pude ver minha mãe e meu pai em tortura. (...) Fui levado a um lugar onde, através de uma janelinha, a voz materna, que meus ouvidos estavam acostumados a escutar, me chamava. Porém, quando eu olhava, não podia reconhecer aquele rosto verde/arroxeado/ensangüentado pelas torturas que o oficial do Exército brasileiro, Carlos Alberto Brilhante Ustra, havia infligido à minha mãe. Era ela, mas eu não a reconhecia".
A
sentença do juiz Gustavo Santini Teodoro assinalou que o DOI-Codi era
"uma casa dos horrores, razão pela qual o réu não poderia ignorar o que
ali se passava". Segundo o depoimento das testemunhas, o torturador
Brilhante Ustra comandava as sessões de tortura com espancamento,
choques elétricos e tortura psicológica. Os gritos e choros dos presos
eram ouvidos até nas celas. Daí a conclusão do magistrado:
OUTROS TEXTOS RECENTES (clique p/ abrir):"Não é crível que os presos ouvissem os gritos dos torturados, mas não o réu. Se não o dolo, por condescendência criminosa, ficou caracterizada pelo menos a culpa, por omissão quanto à grave violação dos direitos humanos fundamentais dos autores".
A COMISSÃO DA VERDADE E A TEORIA DOS DOIS DEMÔNIOS
A LIÇÃO DE MORAL QUE JORGE AMADO RECEBEU DE JACOB GORENDER
JORNAL DA DITABRANDA VENDE O MESMO PEIXE PODRE PELA 2a. VEZ
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