O GOLPE PARAGUAIO
Laerte Braga
O golpe sumário dado pelo Parlamento do Paraguai contra o
presidente Fernando Lugo tem a marca registrada da classe dominante naquele país.
Latifundiários associados a multinacionais, uma força armada corrompida e
cooptada por interesses de grandes corporações, bancos e os donos da terra.
O Paraguai jamais se recuperou da guerra contra o Brasil, a
Argentina e o Uruguai (1864/1870). O conflito foi estimulado pela Inglaterra,
então maior potência do mundo, em defesa de seus interesses econômicos. O
Paraguai não dependia de países da Europa, tinha uma indústria têxtil competitiva
e era um dos grandes exportadores de mate, concorrendo com o império britânico.
O capital para a guerra foi dos ingleses e em meio ao
conflito é que, praticamente, se construiu as forças armadas brasileiras,
inteiramente despreparadas para um confronto de tal envergadura. Nos primeiros
anos da guerra os soldados brasileiros passavam fome e os armamentos eram mínimos,
insuficientes para o genocídio que viria mais à frente. Foi a conseqüência inicial
da avidez do governo imperial de aceitar as libras inglesas.
Os países que formaram a chamada Tríplice Aliança, numa
selvageria sem tamanho, mataram 70% da população paraguaia e até hoje a maioria
acentuada entre os que nascem naquele país é de homens.
De lá para cá o Paraguai tem sido governado por ditadores,
numa sucessão de golpes de estados e o breve período “democrático” que se
seguiu à deposição do último general, Alfredo Stroessner (morreu exilado no
Brasil, era capacho da ditadura militar brasileira), encerra-se agora com a
deposição branca de Fernando Lugo. Um ex-bispo católico, conhecido como o “bispo
dos pobres”. O mandato de Lugo terminaria no próximo ano. O vice-presidente é
do Partido Liberal, aquele jogo político de amigos e inimigos cordiais, onde os
donos se revezam no poder.
O pretexto para a deposição de Lugo foi um massacre de
trabalhadores rurais sem terra, numa região próxima à fronteira com o Brasil. Morreram
manifestantes e integrantes das forças de repressão. De lá para cá Lugo
enfrenta um inferno.
Latifundiários brasileiros, a classe dominante paraguaia –
subordinada a interesses do Brasil e de corporações internacionais – se uniram
contra Lugo e o apoio de empresas como a MONSANTO, a DOW CHEMICAL. o silêncio
formal e proposital dos EUA, todos esses ingredientes foram misturados e
transformados em golpe de estado.
Tal e qual aconteceu em Honduras contra Manoel Zelaya. A
nova “fórmula” para golpes de estado na América Latina. A farsa democrática, o
rito constitucional transformado em instrumento golpista na falta de pudor da
classe dominante. No caso do Paraguai, como no de Honduras, miquinhos amestrados
do capitalismo internacional.
A elite paraguaia jamais permitiu ao longo desses anos
todos, desde 1870, que o país se colocasse de pé novamente. Tem sido um apêndice
de interesses políticos e econômicos de corporações estrangeiras e do sub-imperialismo
brasileiro. Carregam as malas dos donos enquanto submetem os trabalhadores a um
regime desumano e cruel que não mudou e nem vai mudar enquanto não houver
resistência efetiva e nas ruas contra esse tipo de procedimento, contra essa subserviência
corrupta e golpista.
E cumplicidade de
governos vizinhos. Mesmo que por omissão, ou fingir que faz alguma coisa.
E necessária a consciência dos governos de países como o
Brasil que situações de golpe são inaceitáveis. Que a integração latino
americana é fundamental e se faz com democracia e participação popular. Não com
alianças com Paulo Maluf.
Fernando Lugo cometeu erros. O maior deles o de acreditar
que era possível governar o país com grupos da direita. As políticas de
conciliação onde a elite é implacável e medieval, as forças armadas são agentes
– em sua maioria esmagadora – de interesses estranhos aos nacionais e as forças
populares sistematicamente encurraladas pela violência e barbárie.
Ou se percebe que o golpe contra Lugo é um golpe contra toda
a América Latina, ou breve situações semelhantes em outros países. Por trás de
tudo isso, em maior ou menor escala, mas de forma direta os EUA e o que
significam no mundo de hoje.
No que o presidente do Irã, Mahamoud Ahmadinejad chama de colonizadores.
No ano 2000 o economista César Benjamin, numa palestra na cidade mineira de
Juiz de Fora espantou os ouvintes ao dizer que “o século XIX foi o dos grandes impérios
colonizadores, o século XX o do fim do colonialismo, o século XXI vai assistir a
um novo ciclo de colonização de países periféricos às grandes potências”.
A previsão está se confirmando.
O secretário geral da UNASUL, Ali Rodriguez disse em
entrevista a vários jornalistas que “o Paraguai pode estar em meio a golpe de
Estado devido à rapidez do julgamento político do presidente do país, Fernando
Lugo” e mostrou-se preocupado com um possível “processo de violência. Tudo
indica que uma decisão já foi tomada e que pela rapidez com a qual os eventos
estão acontecendo, poderíamos estar perante um golpe de Estado”.
Basta que países como o Brasil e a Argentina, por exemplo,
asfixiem econômica e politicamente o novo governo para que ele não se sustente.
Depende da vontade política de um e outro de manter a democracia no Paraguai,
mesmo frágil, de pé.
A classe dominante paraguaia nunca deu muita importância a
isso, pois sempre consegue espaço para se acomodar e continuar a transformação
do país em uma espécie de vagão a reboque principalmente do Brasil. Desde o fim
da guerra, em 1870 tem sido assim.
Fernando Lugo foi acusado, entre as farsas várias, de
humilhar as forças armadas (existem, ou são esbirros do capitalismo?) e colocar-se
ao lado dos trabalhadores sem terra.
É velho e boçal latifúndio que no Paraguai é a força econômica
mais poderosa.
Os protestos populares acontecem próximo ao Parlamento, mas
já com forças policiais prontas para massacrar e impedir qualquer reação.
É preciso ir às ruas em toda a América Latina e é
fundamental asfixiar essa elite que cheira a esgoto.
Se o governo brasileiro quiser não tem golpe que sobreviva.
O problema é querer. A preocupação hoje, no entanto, é de “consenso possível”
(um fracasso na RIO+20) e as eleições de outubro.
A mídia de mercado – fétida também – no Brasil já
desestimula qualquer atitude mais forte do governo. Afirma que Lugo declarou
que aceitará o “julgamento político”. É mais uma das muitas e constantes
mentiras padrão GLOBAL.
O golpe no Paraguai fere o arremedo de democracia que sub existe
no Brasil e outros países com o consentimento dos “poderes moderadores”. As
elites políticas e econômicas são as mesmas, arcaicas, podres e totalitárias. Quando
querem colocam as garras de fora.
Foi o que fizeram com Lugo. O que querem fazer com Chávez. Com
Evo Morales e outros tantos.
E no fim de tudo atribuir a culpa ao Irã.
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